MEIA PARTE II
Ela tenta Perceber
Se calhar será demais denunciar-te por abuso de poder, duvido demasiado do teu intelecto e do teu discernimento para te achar poderoso.
Cheira-me que a minha origem é agora, para ti, duvidosa - como se a origem fosse moldável.
Que o meu corpo, que tantas vezes te entreguei e não soubeste como aceitar, se transformou num depósito de blasfémias e baboseiras.
Que o meu caractér despropositado, espontâneo, imprevísivel, pueril, racional, inconveniente - que te cativou, enlouqueceu e desatinou como nunca antes ninguém na tua vidinha medíocre havia ousado - se converteu numa coisa da qual se deve ter vergonha. Algo a evitar na tua rotina merdosa do dia-a-dia.
Que os meus interesses e culturas são agora meras afirmações de personalidade, como se precisasse da aceitação ou confirmação de outrem para ser eu própria.
Tu, que tantas vezes me persuadiste com falsos moralismos.
Que tantas vezes me prometeste o mundo.
Que tantas vezes me roubaste o livre arbítrio e o julgamento.
Tu, que me atafulhaste com defeitos e maldades e corrupções inocentes.
Tu, que me cristalizaste como um bibelot de adornar prateleiras
Que me poetizaste como capricho dos teus futuros idealistas e sem rede
Que me envelheceste e me aproximaste da alienação completa
Que me impediste de estabelecer qualquer tipo de relação afectiva, sexual ou intelectual saudável
Tu, que, na pior das tuas conquistas, me fizeste penetrar no teu provincianismo sovina tão tradicionalmente português!
E és agora tu, com as tuas incompatibilidades obscuras e as tuas teorias intrincadas do arco da velha, que tentas recalcar todo este modo de vida; como se tudo isto te fosse perfeitamente anónimo e eu fosse mais um ser inútil nesta realidade cheia de inúteis. E é então que realizo que, pelo teu esforço animal e metafísico de esconder para não acarear, todos os toques, todas as horas, todos os espaços, são agora ocos.
PARTE V
Ele, finalmente, Percebe
O acto de conhecer é inflexível e intolerante;
As pessoas, as relações, os conhecimentos, podem mudar
Mas não se matam os conhecidos.
Grilo de fundo diz: Eles são a prova viva de que viveste, mas já passou.
tudo a borbulhar
Há 3 semanas
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