caminhamos todos os dias nesta realidade pouco ou nada conhecida. relatamos pormenorizadamente os nossos dias para garantirmos que servirão de base a futuras sociedades sobre-humanas que sinceramente nem um tusto darão sobre o que construíste, amigável ser humano. vives com a consciência de que o teu esforço diário para ultrapassar a tua mediocridade é um saborzinho a evolução, sabes também que no fim do dia é ele que te satisfaz. Mas nem o saborzinho é real. Tu só sabes o teu nome porque te chamam. Um cão só te conhece por te cheira e ainda assim tu insistes em chama-lo. Ele não se organizou como tu, felizmente, ele ainda existe numa vasta comunidade de iguais que o cheiram também, ele ainda cheira para conhecer, ele ainda monocromaticamente te vê para te atacar. Tu crês que por chamá-lo o forças a ser igualzinho a ti, mas ele continua a cheirar-te e um dia, depois de o educares segundo as regras da inexistente sociedade democratica e politicamente correcta em que pensas habitar, ele ataca-te de frente quando o fitas. Tu, homenzinho adorável, achas o ataque uma afronta ética à tua moralidade, mas tu, homenzinho adorável, não sabes nunca atacar ninguém de frente.
Pensas-te observador da realidade concreta, mas a verdade que tu não enfrentas é que o facto de organizares os teus conceitos como um míope te torna um imperfeito desconstrutor da realidade. Desconstrutor? - perguntas-me. - Parece-me interessante. Não, homenzinho adorável, tu não és um desconstrutor eficiente és apenas mais um condicionado. Desconstróis, segundo crês, com as tuas tecnologias avançadas mas apenas à tua medida, exactamente da mesma maneira que só sabes o teu nome porque te chamam. Todas as noites cheiras o sexo da tua mulher e não imaginas a que sabe. É em todas essas noites que a seu lado numa quérquera ilegal mas consentida idealizas mulheres robustas emanadas dos teus mais sádicos e recalcados fetiches. É nessas noites também que não consentes olhar para o lado e pôr em prática essas alucinações, pois o que é real está ao teu lado. Não, não - dizes-me - o que é real está na minha cabeça, onde vocês existem e são maus.
Não me construas fachadas à espera que eu acredite, a tua decomposição da realidade nunca é acidental porque tu não o permites, és pouco natural e só sabes fazer o que te ensinam. O teu cérebro ganha bolor pela sua utilização rotineira, tu és um pequeno animalzinho de hábitos e acreditas que o bolor, como a morte, faz parte da vida. Tu copias com os olhos. Não copies com os olhos. Não copies com os olhos! Não copies com os olhos! Concentra-te, concentra-te a fundo, esquece por momentos todos os séculos de humanizada civilização que te proporcionaram e aprecia o caos. Entrega-te, todo, como nunca fazes. Depois, procede reflectidamente a uma acidental decomposição da realidade. Depois, procede a uma interiorização do "caos dos fenómenos visíveis que enchem o espaço". Depois, procedes, em último, a uma concentração da decomposição. Agora, homenzinho amigável, és livre e aberto a infinitas possibilidades.....
Mas não me leves a serio, ser humano, acho que o cérebro é um orgão sobrevalorizado.